segunda-feira, 24 de dezembro de 2018

O reflexo

Um cavalo desenfreado
Quebrando a louça
Barulhos estridentes
No banquete de natal

Nada além de um bicho selvagem
Tentando parecer domesticado
Fingindo que sabe usar os talheres

Não importa o quanto tente
Sempre será um destruidor
De taças e pratos?

Na luz fraca e azulada da lua
Sentado sozinho a contemplar
A beleza de seu reflexo

Sozinho
Olhavá-se
Olhava sozinho
O pesado reflexo

E nada via
Além de um cavalo
Solitário

Então correu
Cabelo ao vento
A mente relaxava

Enquanto corria era livre
Não era um cavalo estabanado
Solitário ou pseudo-domesticado
Quando corria era livre do que via em si

segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Se contente

Nada de especial
Não é nada especial
Você não é nada especial

O troféu mais bonito
Para a sua estante vazia e empoeirada

Risos e álcool
Numa noite para comemorar
A nova aquisição

Mas você não é
Nada de especial
Você não é nada
Especial

Seus olhos opacos admiram
Quadros que nunca entenderá

Aplausos para os charlatões
A vida é vendida enlatada

Na sala de estar
Se é o que se tem a oferecer

Todos atentos procuram
Arranhões no seu troféu

O sorriso do imbecil
Estampado na cara
De quem se contenta
Com o que não sente

Mas nada disso
Realmente importa
Porque a gente não é

Nada de especial
A gente não é nada de nada
Especial a gente não é

terça-feira, 11 de setembro de 2018

Azia

Eu fui engolida por uma baleia
Eu tomo vinho nas ceias
Com meus companheiros de estômago
Nós cantamos e dançamos sempre que achamos que é noite

Se eu enviar uma mensagem numa garrafa
Alguém virá nos resgatar?
Ainda lêem cartas cagadas?
Essa é a geração da comunicação

Joe perdeu um olho
É difícil enxergar no escuro
Procurar por olhos cegos
Na umidade da umbra

Antumbra, pósitron
O mundo é uma piada
Mal digerida
A vida é diferente numa baleia

Lá fora diziam que amavam
Faziam duas ou três promessas de amor
Isso porque eles não me conheciam
Eu posso ser eu mesma aqui na baleia

Pois eu nunca gostei dos jogos sociais de lá fora
Na escuridão dum estômago eu posso cantar
Sobre os tempos que eu não vivi
Sobre palavras que minha boca gosta de pronunciar

Eu não quero que o Sol me cegue de novo
Eu não quero que me abracem como se eu fosse a salvadora novamente
Eu não quero me casar com um meio homem quebrado mais uma vez
Eu não quero fingir que me importo numa sala de jantar, não, não outra vez

Eu gosto das festas estomacais
De dormir no quietude do oceano
Mas um dia o ácido gástrico irá corroer meus pés, e não muito depois o meu cérebro
E eu não poderei mais cantar ou dançar com meus companheiros de estômago



domingo, 9 de setembro de 2018

Desagregada













Embaçada

A água escorre pelo corpo
Anestesiado, morto
Pelo estresse
De viver

A boca seca
Não há água que sacie
Não há comida
Que alimente

Queria arrancar
O coração
Do corpo
Para ver se ainda bate

A dor física e mental
Parecem irreais
Latejam
Como uma memória gasta

Há vida após a morte?
Há vida em vida?

A distopia é real


segunda-feira, 30 de julho de 2018

Eternal

Então, eu cheguei.
Você está pronto?

Passei duas ou três eternidades
Imaginando seu rosto
Idealizadamente desfigurado
Aos meus caprichos solitários

Todos os dias eu morri
E renasci na dor
Da sua ausência

E aqui estou
Implorando com o restos
Dos meus pulmões

Seus olhos parecem mortos
Sua pele tão fria
Ainda existe alma em você?

Eu te abraço
Meu todo fraco coração dispara
Contra a sua inércia

Não consegue se lembrar?
Dos dias quentes da juventude,
Ou do calor dos nossos corpos no inverno!?!

Se eu cantar para você
Será capaz de recordar?

Você costumava dizer que
O amor sempre resiste ao tempo
Mas qual corpo o poder vencer?

Agora toda minha alma derrete
Aos seus pés imóveis

A desilusão dissolverá meu corpo
O tempo também aniquilará minha dor,
Minha querida estátua.

terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

Às 3h

Ele me disse que tudo é feito para findar
Que não queria brincar de "para sempre" comigo

Falou que minha aparência o agradava
Que jamais viu alguém fisicamente mais habilidosa
E isso foi o melhor que saiu de sua boca

Ele tinha a capacidade de fazer-nos
Sentir um lixo em um belo saco plástico
Apenas com um olhar

Enquanto me consumia com os olhos
Minha alma se despedaçava
Em sua neblina de luxúria

Disse que o agora era todo meu
O amanhã nada se sabe
E ontem alguém foi tão especial
Quanto hoje eu sou

Já era um veterano
Me chamou de criança inocente
Riu dos meus planos
Me pediu para pagar-lhe um outro drink

Me prendeu pelos olhos quando eu me levantei para sair
Me perguntou como eu poderia ir embora
Se eu nem tenho para onde

Impediu meu choro
Me fiz rir

Olhou-me como se eu fosse a coisa mais incrível
Citou duas ex-namoradas

Eu me afoguei em um copo caro de álcool
E sorri, como me ensinaram

Me desfaço do seu abraço
Escapo meu corpo de suas mãos pervertidas
Suas unhas arranharam minha autoestima
Deixei um rastro de sangue

Enquanto a rua me desintoxicava
Eu tive pena dele
Era um coração massacrado,
Dominado pelo medo da dor de amar

terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

O corredor cOmPRIMIDO

Fora de controle
As unhas se cravam na pele
Arranham a carne
O sangue escorre 

Escravo da gravidade
O corpo oprimido se levanta
Por reação
Nunca fez nada por vontade própria

Gostaria de ser 
Afagado como uma vítima
Mas se é o próprio vilão
Segurando sua coleira

O ódio consome
Invadindo suas veias
Dominando
Mas a gravidade oprime

Aniquilando-se
Esmagado de dentro pra fora
De fora pra dentro
Seus gritos morrem antes de se propagarem

Mas quando pôs-se a correr
Por um breve momento esqueceu
Que é um prisioneiro de si
Acredita-se livre

O vento cortando a matéria
Libertando-o de si
Rasgando o corpo
Escapado

Deixando para trás 
O tirano vitimizado
Como uma concha pequena 
Que já não servia

Respirou pela primeira vez
O ar queimou seus pulmões
Mas dessa vez ele pode gritar
Ele se sentiu existido

Abriu os olhos
Era tanta dor
Porém se sentia feliz
Chorou porque quis

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

Bárbara

Olhe como ela anda por um rico céu estrelado
Senta-se entre reis e rainhas
Janta com deuses, dança com nobres
Ela ri com os conselheiros dos Grandes

Mas nesses palácios e castelos seu coração não está
Essa pessoas só fazem barulhos inteligíveis
Ninguém nunca se cala, os ouvidos dela sangram
Implorando pela música das árvores

Veja como ela pinta o rosto
As jóias que a adornam
Esses vestidos caros e belos sapatos desconfortáveis
Ela está fantasiada, mas nada maqueia a alma

Por baixo de tanta tinta e sorrisos falsos
Seus olhos choram
O corpo grita
Ela sabe onde seus pés anseiam para pisar

Ela olhou o horizonte procurando 
Procurando o que chamar de casa
Seu espírito é selvagem, animalesco
Se sentia presa na frequência dos ruídos dos abastados

Ela quer andar nua, suja de lama
Sentir o cheiro do sangue e da adrenalina
Ela é bicho, criatura do jângal
Estava morrendo como um pássaro na gaiola

Subiu num parapeito futilmente ornamentado
Riu de tanta imbecilidade que se pôs a viver
Se lançou ao mar
Sem hesitar foi para a liberdade

sábado, 27 de janeiro de 2018

Bêbado

Ele disse que eu era bonita
Acho que estava falando para ele mesmo.
Um bêbado patético
Não passava de um bêbado!

Era tarde,
Eu procurava uma boa desculpa para ir embora.
Ele tagarelava tanto que eu já não o ouvia
Não há pior silêncio do que o barulho.

Arrastei-o até sua casa
Caiu três ou quatro vezes
Queria ficar deitado no chão
Eu preferia deixá-lo ali também.

As estrelas fugiam
O Sol iria nascer
Meus olhos trabalhavam como escravos para me manter acordada

Joguei-o em seu portão e parti